segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Massinhas de gente

- Lá fora ta mais quente. Vem, vamos sair.
- Não amor, não ta. É frio da alma, como gelo no coração. Você pode ir, vá comprar bananas que essas aqui já estão bem pretas.
- Te deixar passando frio aqui, claro que não vou. Faço chá, vou lá na cozinha, vamos, te dou um cobertor.

Não me engane assim Dani, você sabe que sente mais frio que eu, só consegue disfarçar mais. Vou arrumar as mangas da sua blusa de moletom, não sei por que é tão desleixada! Devem ser os braços finos, te dão um ar largado demais. E essa sua cara rechonchuda, nunca vi ser tão contrastante. Só os cabelos é que são de beleza mais normal. Muito normais, muito encaracolados.

- Aqui ta com cheiro de gás ou é impressão minha? Vou fazer de camomila, só pra você parar de se estressar com o frio.
- Faça o que te achar melhor. Não estou estressada.
- Você é uma chata. Egoísta e chata. Toda mimadinha nhemnhemnhem, venha, me mostre suas porcelanas da China.
- Do que te entende a China se não os espetinhos de escorpião? Não vou levantar da cadeira, está frio demais. A água já vai ferver, melhor desligar. Chá com água fervida não é bom.

A gente ficou lá, bebendo chá e comendo as horas. Ah meu amor, não estaria seu coração demasiadamente enganado? Seu chá é tão ruim quanto seus sentimentos. Como poderia amar-te, se tenho já Fernando? Sabe que sou apaixonada por ele, mesmo não recebendo mais suas mensagens, deve ter acontecido alguma coisa com ele.

- Larga ele Morena, a gente ia ser tão feliz. Não se sente feliz agora?
- Meus dedos estão quentes sim, obrigada pelo chá. Será que ligo para o Fernando? Estou tão preocupada. "Estou", ninguém fala "estou"... Enfim, faz um tempão que não recebo as mensagens dele.
- Ah Morena... Vê se checa o gás, to sentindo um cheiro bem forte, você não? Bom, toma cuidado, eu tenho que voltar pra escola.
- Vai Dani, boa aula tá. Manda um oi pra Júlia, fala que... Fala que eu já to morando com o cara.

Tive que ir abrir o portão pra ela. Ta frio como no meu inferno! Entro correndo em casa e ligo pro Fernando. Que me atende e diz que está em reunião. "Ah, vou largar a escola! Morar com o amor de minha vida, ficar com ele dias inteiros, só quando não tem que viajar pelo trabalho". Ponho pesadamente a mão na barriga, me sinto tão grávida! Se chamará Lúcia, e espero que seja uma menina bem bonita e tola. Sim filha, seu pai me fez acreditar.

domingo, 22 de setembro de 2013

Não precisa gastar pra gostar

Eu quero a honestidade na alma de todos os homens mal amados. Quero a amargura dos lábios dos perdedores e angustiados. Quero o sorriso daqueles que choram escondidos dentro de seus corações. Quero o grito de todas as pessoas que erram sem saber que são completos idiotas.

Não sei oque se passa na cabeça daqueles que acham a felicidade nos dias agitados. Não sei oque há de mal no ócio. Ele é bonito de se escrever, difícil de se aceitar e é tão rejeitados pelos engomadinhos classe c.

Verdadeiramente pensando, uma rotina corrida nada traz à vida se não uma ignorância de reflexão. Eu sei que muitos já pararam e pensaram tudo oque evitaram pensar durante muito tempo, durante toda uma não vida, e caíram numa tristeza profunda a ponto de não conseguir interromper as lágrimas, a ponto de entregar sua alma total e plena ao ócio.

Infeliz suor da alma, sentiu sair pelos olhos, aquele que sentia vergonha dos sentimentos. Tão vergonhoso se tornou, que acabou por só saber sofrer.

sábado, 14 de setembro de 2013

Monólogo

"A música passava de um ouvido à outro, como se existisse um vazio entre eles e meus pensamentos fossem traduzidos na melodia que saia dos fones encardidos. Sentei no canto mais escuro do quarto e me obriguei a chorar, haviam lágrimas demais dentro de mim."

Um garoto apaixonado, apaixonado pelas coxas e pelos seios, pelo rosto e a cintura, os pés não, eram grotescos e largados. E ela ainda era inteligente e culta, a garota mais incrível que já conhecera... Como não amar? Como não querer passar o resto de sua eternidade ao lado da pessoa feita exatamente para ele? Tão dele achava, que não suportava qualquer exibição alheia por parte de Clara.

Era de dia, os trens corriam freneticamente no meio da semana, e os dois andavam de mãos dadas no centro da poluição. Ela de saia, ele de olhos e coração. Uma rajada de vento subiu diretamente da calçada até os cabelos da menina mais linda do tempo e espaço. Maldito trem, malditas nádegas tão encantadoras! Todos se não mais Cláudio viam as tão lindas almofadas dela numa calcinha azul de listras brancas, enquanto sua saia flutuava em volta da cintura. Uma angústia o tomou imediatamente. Não! Ninguém mais podia admirar tal preciosidade se não ele mesmo. O ciúme escapou-lhe pelos olhos. O embaraço queimou-a nas bochechas.

"Por quê?"

Indagou como se fosse o cara mais sem sorte do mundo, como muitas vezes o fazia, cortava-se com papel e lamentava sobre a vida, caindo mais uma vez em seus sonhos descoloridos. 

Emaranhados fios de pensamentos enchiam e esgotavam sua pequena cabeça coberta por cabelos enrolados, e migravam para o coração e demais órgão, causando-lhe doenças sem diagnóstico. Um sentimento tão grande que se tornava um nada, pensamentos quaisquer que faziam os fios de lágrimas saírem pelos olhos. "Uma doença horrível" disse a mulher sua vizinha, a que fazia simpatias para o inimigo ser acordado enquanto pegava no sono. E realmente era terrível! Receber um diagnóstico da vizinha, que horror!

Onde estava Clara nesses momentos? Ao seu lado, sempre como devia estar. Sempre, o amor estava com ele. Tão constante era sua presença que deixara de ser um sentimento tão valioso como pensava. Almejou tanto o amor e pouco tempo depois já o desprezava, e pouco tempo depois já havia se acomodado.

Triste vida era a dele, nem mesmo em sonhos coloridos encontrava a paz. Era um monólogo não percebido, e assim foi atuando cansado, achando que a tristeza vinha de fora.

sábado, 7 de setembro de 2013

Os bancos precisam de almofadas

Sentou-se naquele banquinho de madeira, rude demais para suas tão delicadas almofadas. Juntou as pernas dobradas com os braços magrelos, e sua face faceta apareceu por cima de seus joelhos.

Eu estava absurdamente apaixonado, perturbadoramente fascinado por aquela menina de suor tão puro quanto a água, poderia viver só dela. Seria minha felicidade, meu sofrimento, meu alimento, meu entretenimento, meu tudo.

Como me encantava suas feições, sabia que tinha apenas quatorze anos, mas se mostrava como uma mulher madura de vinte e poucos. E quando me beijava no pescoço, podia ver perfeitamente a forma de seus seios seguros do encanto que causavam.

Passou-se o tempo, vimos-o passar juntos, e seus vinte e poucos anos chegaram, e meus quarenta e tantos também. Não era velho quando a conheci, se você como eu pensa que trinta e cinco é o ápice da vida, mas a diferença era gritante, ainda mais agora, com rugas em volta dos olhos e o sorriso marcado. Meus cabelos grisalhos exitavam minha menina, claro, mas bem, não vou comentar como seu corpo adulto me exitava ainda mais...

Minha menina amava com tanta sabedoria que fazia-me parecer um garotinho, me sentia com quatorze e ela com quarenta e tantos, e assim até a senhora morte se fez acreditar, levando-a antes de me carregar em seus braços de fumaça.

Profundamente desolado, como faria agora? Não tinha mais meus sentimentos, nem meu alimento, nem nada. Virei um vazio em forma de bicho homem. Implorei com tanto ardor pra senhora fumacenta me levar que caiu a rir. "Patético" ela disse, "Não teria coragem de morrer". Como não? Se sentia-a me morto já naquele momento? "Por favor" implorei incansavelmente, então dançamos. Dançamos tanto e tão entretido fiquei que me sentia vivo novamente, quando cai nos braços magrelos de alguém. Era minha menina.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Oh, homens

Um dia eu estava andando, andando mesmo, com minhas pernas e pés e corpo inteiro. Do meu lado, um senhor, sorridente e despreocupado andava junto. Eu estava indo pra casa, e ele procurando a sua. Não trocamos olhares, nem compartilhamos partezinhas da alma, mas estava estampado em seu nariz o quão grande era a sua felicidade.

"Como seria sua casa?" me indaguei furiosamente minutos depois... Simples, claro! Pois era homem, e não precisava de algo grande, bonito ou... rico. Era homem, e homens são movidos à cobre, não ouro ou coisa mais sofisticada, mas pelo simples e abundante cobre. Não precisava de muito pra agradá-lo, mas quando agradado, ficava assim, pleno como numa casa invisível.

Homens, homens, claro que são bichinhos bem interessantes, um deles aliás, acabou de passar em frente à minha casa, com olhinhos de rato, curiosos e desconfiados. Outros que vejo na rua tem bigodes tão bonitos quanto eu poderia almejar, seria um absurdo desejar um bigode tão bem amado.

Outros eu vejo e penso "caramba, como eles conseguem se diferenciar?" deve ser uma dificuldade imensa! Assim como é dificílimo saber qual Slitheen é qual. 

E alguns, os que eu mais gosto, tão bonitinhos, com a alma enroladinha na dificuldade de enxergar o futuro. Não enxergam mesmo, aliás, não conseguem ver além de seu braço esticado. E são lindos, graciosos e perfeitos, de olhar e de tocar, de andar junto e ver as ruas envelhecerem, de acordar e perceber que não vão sair da cama até dormirem de novo, de chorar e saber que logo mais vão estar rindo, de amar e saber que não é perda de tempo.

Claro, tem muito mais coisa escondida nas barbas que roçam o tempo, e que assim como a simplicidade de tudo que os rodeia, vai chegar até nós como um sopro na orelha.