Ela o viu poucas vezes apenas, mas o
"homem do sorriso bonito" como o denominara, ganhou um lugarzinho em
seu coração.
O mundo todo estava errado, e encontrava
sua verdade na realidade daqueles lábios curvados que combinavam perfeitamente
com seus olhos gentis. Viu-o pela primeira vez no fatídico dia absurdamente
claro, em que sua cabeça latejava e seu rosto aparentava ter sido várias vezes
amassado como uma folha de papel. Trajava roupas velhas, porém novas, uma
camiseta que ganhara em seu aniversário há um ano e uma calça que comprara há
dois, as últimas peças novas que lembrava possuir. Com tal vestimenta e os
olhos semicerrados devido a demasiada claridade, encaminhou-se a farmácia
próxima ao seu trabalho e pegou três cartelas de comprimidos para dor de
cabeça, ao fazê-lo avistou no penúltimo caixa oque estava predestinado a seus
olhos naquele dia, um homem alto, de cabelos pretos bem cortados, olhos gentis
e um sorriso lindo, destoava de todas aquelas pessoas rastejantes ao seu redor,
inclusive ela.
Como todas as outras pessoas talvez, se
sentia inferior, porém dona de todas as verdades do mundo, mas apesar de toda
essa negatividade e crise existencial que a tomava por completo, sentia-se
especial e privilegiada por cruzar o caminho com uma pessoa como aquela no
caixa de uma farmácia, onde além de encontrar conforto à sua dor física, achou
também para sua alma descolorida.
"Boa noite" e
"Obrigada" foram as palavras ditas pelo homem do sorriso bonito,
palavras que ela guardou com grande ternura. Palavras que a consolavam em dias
de melancolia, dias em que voltava para casa e chorava baixinho debaixo das
cobertas.
Passava de vez em quando perto da farmácia
quando ia ao trabalho, e procurava ele com um breve olhar, sem parar de
andar.
Nunca mais se falaram, mas seu romance,
que durou uns poucos minutos, ficou gravado no tempo por toda a eternidade.