sexta-feira, 29 de abril de 2022

O Peixe

    Não sei bem quando isso começou a acontecer, só sei que um dia indo ao trabalho de ônibus, percebi que um filhote de peixe estava nascendo na ponta do meu dedo anelar direito. Mesmo sabendo que nada havia ali, eu sabia que essa criatura prematura emergia da extremidade do meu corpo, me fazendo sentir de certa forma feliz e transtornada.

    Diversas vezes o tocava e olhava com atenção na espera de que ele saísse dali, mas nada acontecia.

    Tão repentino foi seu surgimento quanto seu desaparecimento, ainda dentro do ônibus ele se foi, deixando um vazio que não estava ali antes, como se eu mesma tivesse fugido dali.

    Vivo bem sem ele, como antes já fazia. Acredito que vivo até melhor após esse acontecimento. Foi como se o filhote de peixe me levasse pra outro lugar, numa outra dimensão, quando eu era mais jovem, onde o tempo passava mais devagar e as questões que me perturbavam eram mais dignas.