domingo, 29 de abril de 2012

Diário de Clarice II

Procurar palavras que descrevam o amor é perda de tempo. Um sentimento tão forte e lindo não pode ser definido por palavras tão complexas. Porque não apenas senti-lo?

Eu o encontrei novamente, na feira, pedindo maçãs com um sotaque francês tão espontâneo que fez meu coração disparar, e meus olhos brilharem como se estivessem úmidos por lágrimas.
Leandro era francês. Isso explica seus olhos curiosos de turista, e os lábios ansiosos pela próxima palavra.

Fiquei observando-o por bastante tempo. As vezes imaginava ir falar com ele, um "Bonjour" poderia lhe chamar a atenção, ele então me veria, se apaixonaria a primeira vista, e viveríamos felizes. Ou acharia-me louca e ignoraria completamente, depois de um olhar cortante de desgosto claro. Ele se foi... e eu também. Minha dose diária de sentimentos melancólicos, os realistas, me esperava tristemente em casa.

Será mesmo o amor essas cóseguinhas no estômago? As melancolias do dia-a-dia deram solidariamente espaço para os devaneios apaixonados. Ah como é bom devanear. Tão claros e alegres.

Eu me denunciava por completo, como se gritasse ao mundo, "Eu estou estranhamente apaixonada!". Me denunciava, como bocas que denunciam mentiras, olhos que denunciam desejos, ou gestos que denunciam a insegurança. 

Era sincero, e não ligava se fosse para sempre ou para agora e apenas agora. Eu estava feliz, eu estou feliz, e isso é o que devia importar.

Se você soubesse, que só o fato da sua existência me tranquiliza, e que o som de sua respiração me faz sorrir, se você soubesse, que te amo, tanto, não saberia mais de nada, do preço das maçãs, ou da língua portuguesa que fala tão esforçadamente.

Iria existir só eu, e você, e nosso mundo se formaria, e desmoronaria todos os dias, assim como deve ser.

                                                                                                                                                                                                                 Je t'aime, et seulement.

Ruínas

Desabou suas lágrimas no peito de Cláudio, abraçou-o como se nada fosse mais confortante. Vendo aquela criatura tão frágil, molhando sua camisa com lágrimas guardadas já a muito, ele percebeu que esta sempre fora a dona de seu verdadeiro amor. Envolvendo-a nos braços, fez-se o melhor consolo para Clarice.

Um borrão preto de olhos se mostrou, e dentro deles, um brilho tristonho olhava para olhos verdes tão apaixonados.

Quem sabe quantas palavras cabem em um único gesto, sabe o quanto Clarice agradeceu por ter Cláudio naquele momento.

Nenhum beijo se deu, nenhuma palavra se proferiu, apenas um abraço banhado de lágrimas encerrou aquela tarde tão agonizante.


sexta-feira, 6 de abril de 2012

"Você pensa que ninguém lhe entende, quando na verdade, todos pensam como você"

Desejos

Uma, duas semanas se passaram e Clarice quase morrera de tédio. Estava cansada de tudo e de todos, seus pulmões caíram. Tornara-se o tipo de pessoa mais odiável por ela, os sobreviventes.

Vivera do sonho até não reconhecer mais sua própria realidade. O ócio, seu companheiro inseparável dos últimos dias, a fazia um mal terrível. O que de melhor podia-se fazer se não então pôr por escrito todos os seus pensamentos e desejos? Em um pedaço de papel escreveu:


"Traga-me o amor, por favor, com tudo que lhe é direito. O sofrimento desconhecidamente mútuo, as lágrimas aparentemente inesgotáveis, a ansiedade trêmula, a decepção dolorosa, o prazer aflitivo, a felicidade infinita, o medo da perda, a perfeição em meus olhos, e a ligação do meu coração.

E se puder, traga também algumas cartas apaixonadas e fotos reveladas, para que eu possa guardar em minha caixa vermelha da sapato, as lembranças desse amor que nunca à de terminar."


Queimou-o em sua janela, na esperança de que alguma força divina encontrasse e realizasse seu desejo tão egoísta.

Sem perceber, uma brecha enorme fora aberta em seus sentimentos. Saiu, não aguentava mais permanecer dias inteiros dentro de casa. Pegou o suéter vermelho do cabide, amarrou os braços contra o peito e afundou-se cidade adentro. Estava um dia frio, porém ridiculamente claro. 
O Sol brilhava orgulhoso em seu pico, apontando todos os defeitos daquela garota de mente perturbada. O sorriso do malabarista no sinal vermelho parecia debochar de seu rosto tomado pela tristeza. Pobre Clarice. Seu coração apertado a matava tortuosamente, e ninguém conseguia entender.

O botão de seu suéter caiu, por uma linha vermelha mal costurada. Rompera-se. E aquilo foi motivo suficiente para fazê-la chorar.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Nuvens azuis

Ele foi visto, Cláudio foi visto no terraço, pintando o céu numa folha de papel, o qual estava tão azul quanto seu cabelo.
Estava satisfeita apenas por poder observá-lo a seguros 2 metros de distância, sentindo toda aquela nostalgia inexplicável.
De repente, viu-se fitada pelo homem de sua paisagem. Alguns segundos que pareceram algumas horas.
A fitação mútua, nada mais acelerante para o coração. 
Porém os dois continuaram neutros, calmos, como se seus olhares se encontrassem constantemente.
Levantou-se, com o papel e o lápis na mão, andou em direção a Clarice, e entregou-lhe o desenho. Uma ultima olhada antes de descer as escadas...
Ela ficou parada, ali em pé, segurando o desenho que lhe fora entregue por mãos tão gélidas. A paz emanava em todo o seu ser, o coração batia harmoniosamente, não raciocinava, só sentia, sentia suavemente como a brisa lhe tocava a face, e como sua vista ia muito mais além dos prédios da cidade.