sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Ah, o amor

- Não foi nada demais, só mais um caso ao acaso.

- Eu não diria isso levando em conta os dezessete encontros que tivemos.

- Diga isso ao advogado e veja oque ele acha, suas palavras só vão servir no tribunal querida, você quer o divórcio ou não?

- Não me diga divórcio, se não saio dançando por aí.

- Ah, e mais uma coisa, meu cobertor, você sabe que eu não vivo sem ele, está na sua lista de devoluções.

- Te devolvo quando tiver de volta o boneco Ken que te emprestei há dez encontros. Aposto que está usando naqueles seus tanques camuflados outra vez.

- E está sendo melhor utilizado agora. Ele detestava ficar com as suas Barbies, tem masculinidade correndo debaixo daquela pele de plástico bronzeada.

- Diga isso pro suéter que ele pegou emprestado da minha Barbie Malibu.

- São roupas, blergh. Isso não quer dizer nadica de nada. Como aqueles seus vestidos de florzinha, só de pensar neles fico com enjoo.

- Você adorava aquele verde que eu sei...

- É verdade... Deixava seus cabelos mais loiros do que já são...

- Bom... Pode ficar com o Ken se você quiser. Minha mãe disse que ia comprar uma Polly pra mim mesmo.

- Obrigada... Mas vai ter que devolver o cobertor de qualquer jeito.

- Eu sei, eu sei. Mas a gente ainda pode ficar de bem, certo?

- Acho que sim, o Luís é sempre chato pra brincar de advogado mesmo.

- E a Márcia como juíza é muito chata, tem que ser tudo do jeito dela, argh!

Os dois sorriram simultaneamente e se casaram e separaram outras várias vezes, enquanto corriam pelo jardim de mãos dadas levando pelo gramado a simplicidade de um amor de verdade.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Sai de Costas pra não pegar encosto

Era a família Costa, não a Moura ou a Prado ou qualquer outra de sobrenome engomadinho. Os Costa sofreram desde sempre, com os mestiços e os branquelos, agora com as cáries e as pulgas.

Roberto não sabia mais oque fazer, seus filhos tinham os dentes cariados, sua esposa implorava por carinho e seu emprego o largara. Oque fazer agora Roberto? Eu é que não queria estar na sua pele.

Foram dias não? Vagando pelas ruas procurando um rumo à não mais vida individual, mas de todos os Costa, os Costa Júnior, a Costa esposa, o Costa pai, a Costa falecida mãe e o Costa pobre e perdedor... Roberto Costa.

Sorte ou azar o deles que eram conhecidos por toda a vizinhança, logo mais toda a cidade, logo mais, tornariam-se conhecidos pela ciência das pessoas importantes. Não que existam pessoas mais importantes que outras e... Vocês entenderam... Ou não? Adoraria discutir sobre o não entendimento nos comentários que nunca recebo. Sintam-se a vontade.

Bom, o Marcelo Camelo não dizia? "Os bravos são escravos sãos e salvos de sofrer". Com aquela barba tão sábia parecida com a do Beto, só que bem diferente, se é que vocês me entendem.

Em um dia, quente, bem quente, o homem mais inocente e bondoso do mundo quis ajudar a família Costa, quando achou um saco de feijão na rua e pensou "Oh, levarei aos pobres Costa, eles estão com tanta fome, e aquelas crianças precisam de ferro, muito ferro." Ah, quem me dera fosse Fábio um pouco mais inteligente ou perspicaz, já seria suficiente.

O saco de feijão, vindo de lugar desconhecido, foi aceito de bom grado, estavam famintos, famintos! E as crianças ficaram tão felizes.

Na semana seguinte foi vista num canto do jornal a família Costa, uma família inteira morta por combustão espontânea. Ora isso foi oque rodou pelo mundo, tornaram-se destaque até lá na América de Cima! Ah, se o Beto estivesse vivo pra ver isso... Desejaria voltar no tempo pra não aceitar aquele saco de feijão. Já que Fábio o achara em meio à umas velas e bebidas.

Era magia negra, e todos acharam que era ciência.



sábado, 9 de novembro de 2013

Era fusca?

Ela foi de encontro aos lábios dele e saiu correndo, nessa de sair correndo um carro lhe acertou em cheio, e seu corpo dividiu-se em dois, como se fosse um palito de sorvete. Ele não sabia se aquilo que estava vendo era sonho, pesadelo ou devaneio...

Ora se não estava a pensar em atirar-se frente a um carro minutos atrás, o namoro era péssimo e tinha vontade de se matar, um inferno em vida. Morrer, qual a maior curiosidade se não a que vem após a vida? Não teria oque perder, já estava morto em vida. Mas ver a garota mais terrível do mundo ser atropelada partiu-lhe o coração.

E não é que a amava mesmo. Foi com a tristeza que achou a resposta pra seu sentimento mais evidente.

Tadinha, morrer daquele jeito, com lágrimas nos olhos e raiva na alma, pro inferno é que não foi, precisava se purificar a coitada.

E o garoto tolo e sentimental... Morreu de tristeza, morreu de angústia e fez-a morrer em esquecimento alguns meses depois.

É assim sistemático e simples, nenhuma desculpa seria tão mais banal, e nenhum arrependimento curaria os calos do coração.

É sangue derramado só pra limpar um pouco a futilidade.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Aflição

Eles me prometeram a cura, e agora eu sou um corpo drogado e intoxicado.

Meu quarto cheira a alvejante e é tão escuro que não sei se estou mergulhada em sonhos ou afogada nos pensamentos. Não vamos falar de sentimentos hoje por favor, sentimento é sujo e repulsivo.

Nem sei oque é verdade e oque é cenário do meu mundo, só são reconhecíveis as sombras das baratas que não se escodem mais a noite e das pessoas que se protegem de um suposto estuprador que está com medo de ser roubado pela pessoa de trás com um spray de pimenta na mochila.

Um efeito dominó.

A verdade e a resposta absoluta é que não existe essa de verdade, é tudo mentira da vida. Tudo sujeira do próprio pensamento que entope as artérias do saber.

Me prometeram a cura, mas a cura não existe se o problema vem da sua imaginação.


terça-feira, 22 de outubro de 2013

Canto

Ele tinha cabelos tão espetados!
Agudos e espetados, tão oh! 
Espetados.

Suas mechas apontavam precisamente para cada canto escuro da alma das pessoas. 
Cada canto brusco e sem melodia. 
Cada canto barulhento e sem sincronia. 
Cada canto cantado sem vontade.


quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Se fosse Dele

Um fone plugado, a outra orelha na realidade, no barulho urbano, o caos! Oh, o caos!

Ele chegou assim bem pertinho de mim e falou "Onde fica a farmácia?" a farmácia estava ao nosso lado quando perguntou. Que nojo! Morri de nojo na hora, quase lancei-lhe um vômito dizendo "Ao seu lado, velho tarado!" Aposto que ia comprar viagra e camisinha.

Parecia, e tenho certeza que era um daqueles caras (velhos) que falam "Bebo socialmente" com pose de lorde da praça. O tipo que mais detesto. Ou você é sóbrio ou vive turvo, sem essa de socialmente, socialmente, igual, bebo para mostrar aos outros que bebo, bebo para que os outros não fiquem incomodados com minha quadradísse, bebo para relaxar, bebo para dormir bem, bebo, apenas bebo quando quero.

Nem vomitei, nem gritei, nem fugi com a minha alma. Só me senti mal, extremamente mal por ter pensado coisas como essa. Eu sou desprezível! Tenho nojo de mim. Oh, sou um velho desprezível!

Se fosse do Veríssimo...

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Massinhas de gente

- Lá fora ta mais quente. Vem, vamos sair.
- Não amor, não ta. É frio da alma, como gelo no coração. Você pode ir, vá comprar bananas que essas aqui já estão bem pretas.
- Te deixar passando frio aqui, claro que não vou. Faço chá, vou lá na cozinha, vamos, te dou um cobertor.

Não me engane assim Dani, você sabe que sente mais frio que eu, só consegue disfarçar mais. Vou arrumar as mangas da sua blusa de moletom, não sei por que é tão desleixada! Devem ser os braços finos, te dão um ar largado demais. E essa sua cara rechonchuda, nunca vi ser tão contrastante. Só os cabelos é que são de beleza mais normal. Muito normais, muito encaracolados.

- Aqui ta com cheiro de gás ou é impressão minha? Vou fazer de camomila, só pra você parar de se estressar com o frio.
- Faça o que te achar melhor. Não estou estressada.
- Você é uma chata. Egoísta e chata. Toda mimadinha nhemnhemnhem, venha, me mostre suas porcelanas da China.
- Do que te entende a China se não os espetinhos de escorpião? Não vou levantar da cadeira, está frio demais. A água já vai ferver, melhor desligar. Chá com água fervida não é bom.

A gente ficou lá, bebendo chá e comendo as horas. Ah meu amor, não estaria seu coração demasiadamente enganado? Seu chá é tão ruim quanto seus sentimentos. Como poderia amar-te, se tenho já Fernando? Sabe que sou apaixonada por ele, mesmo não recebendo mais suas mensagens, deve ter acontecido alguma coisa com ele.

- Larga ele Morena, a gente ia ser tão feliz. Não se sente feliz agora?
- Meus dedos estão quentes sim, obrigada pelo chá. Será que ligo para o Fernando? Estou tão preocupada. "Estou", ninguém fala "estou"... Enfim, faz um tempão que não recebo as mensagens dele.
- Ah Morena... Vê se checa o gás, to sentindo um cheiro bem forte, você não? Bom, toma cuidado, eu tenho que voltar pra escola.
- Vai Dani, boa aula tá. Manda um oi pra Júlia, fala que... Fala que eu já to morando com o cara.

Tive que ir abrir o portão pra ela. Ta frio como no meu inferno! Entro correndo em casa e ligo pro Fernando. Que me atende e diz que está em reunião. "Ah, vou largar a escola! Morar com o amor de minha vida, ficar com ele dias inteiros, só quando não tem que viajar pelo trabalho". Ponho pesadamente a mão na barriga, me sinto tão grávida! Se chamará Lúcia, e espero que seja uma menina bem bonita e tola. Sim filha, seu pai me fez acreditar.

domingo, 22 de setembro de 2013

Não precisa gastar pra gostar

Eu quero a honestidade na alma de todos os homens mal amados. Quero a amargura dos lábios dos perdedores e angustiados. Quero o sorriso daqueles que choram escondidos dentro de seus corações. Quero o grito de todas as pessoas que erram sem saber que são completos idiotas.

Não sei oque se passa na cabeça daqueles que acham a felicidade nos dias agitados. Não sei oque há de mal no ócio. Ele é bonito de se escrever, difícil de se aceitar e é tão rejeitados pelos engomadinhos classe c.

Verdadeiramente pensando, uma rotina corrida nada traz à vida se não uma ignorância de reflexão. Eu sei que muitos já pararam e pensaram tudo oque evitaram pensar durante muito tempo, durante toda uma não vida, e caíram numa tristeza profunda a ponto de não conseguir interromper as lágrimas, a ponto de entregar sua alma total e plena ao ócio.

Infeliz suor da alma, sentiu sair pelos olhos, aquele que sentia vergonha dos sentimentos. Tão vergonhoso se tornou, que acabou por só saber sofrer.

sábado, 14 de setembro de 2013

Monólogo

"A música passava de um ouvido à outro, como se existisse um vazio entre eles e meus pensamentos fossem traduzidos na melodia que saia dos fones encardidos. Sentei no canto mais escuro do quarto e me obriguei a chorar, haviam lágrimas demais dentro de mim."

Um garoto apaixonado, apaixonado pelas coxas e pelos seios, pelo rosto e a cintura, os pés não, eram grotescos e largados. E ela ainda era inteligente e culta, a garota mais incrível que já conhecera... Como não amar? Como não querer passar o resto de sua eternidade ao lado da pessoa feita exatamente para ele? Tão dele achava, que não suportava qualquer exibição alheia por parte de Clara.

Era de dia, os trens corriam freneticamente no meio da semana, e os dois andavam de mãos dadas no centro da poluição. Ela de saia, ele de olhos e coração. Uma rajada de vento subiu diretamente da calçada até os cabelos da menina mais linda do tempo e espaço. Maldito trem, malditas nádegas tão encantadoras! Todos se não mais Cláudio viam as tão lindas almofadas dela numa calcinha azul de listras brancas, enquanto sua saia flutuava em volta da cintura. Uma angústia o tomou imediatamente. Não! Ninguém mais podia admirar tal preciosidade se não ele mesmo. O ciúme escapou-lhe pelos olhos. O embaraço queimou-a nas bochechas.

"Por quê?"

Indagou como se fosse o cara mais sem sorte do mundo, como muitas vezes o fazia, cortava-se com papel e lamentava sobre a vida, caindo mais uma vez em seus sonhos descoloridos. 

Emaranhados fios de pensamentos enchiam e esgotavam sua pequena cabeça coberta por cabelos enrolados, e migravam para o coração e demais órgão, causando-lhe doenças sem diagnóstico. Um sentimento tão grande que se tornava um nada, pensamentos quaisquer que faziam os fios de lágrimas saírem pelos olhos. "Uma doença horrível" disse a mulher sua vizinha, a que fazia simpatias para o inimigo ser acordado enquanto pegava no sono. E realmente era terrível! Receber um diagnóstico da vizinha, que horror!

Onde estava Clara nesses momentos? Ao seu lado, sempre como devia estar. Sempre, o amor estava com ele. Tão constante era sua presença que deixara de ser um sentimento tão valioso como pensava. Almejou tanto o amor e pouco tempo depois já o desprezava, e pouco tempo depois já havia se acomodado.

Triste vida era a dele, nem mesmo em sonhos coloridos encontrava a paz. Era um monólogo não percebido, e assim foi atuando cansado, achando que a tristeza vinha de fora.

sábado, 7 de setembro de 2013

Os bancos precisam de almofadas

Sentou-se naquele banquinho de madeira, rude demais para suas tão delicadas almofadas. Juntou as pernas dobradas com os braços magrelos, e sua face faceta apareceu por cima de seus joelhos.

Eu estava absurdamente apaixonado, perturbadoramente fascinado por aquela menina de suor tão puro quanto a água, poderia viver só dela. Seria minha felicidade, meu sofrimento, meu alimento, meu entretenimento, meu tudo.

Como me encantava suas feições, sabia que tinha apenas quatorze anos, mas se mostrava como uma mulher madura de vinte e poucos. E quando me beijava no pescoço, podia ver perfeitamente a forma de seus seios seguros do encanto que causavam.

Passou-se o tempo, vimos-o passar juntos, e seus vinte e poucos anos chegaram, e meus quarenta e tantos também. Não era velho quando a conheci, se você como eu pensa que trinta e cinco é o ápice da vida, mas a diferença era gritante, ainda mais agora, com rugas em volta dos olhos e o sorriso marcado. Meus cabelos grisalhos exitavam minha menina, claro, mas bem, não vou comentar como seu corpo adulto me exitava ainda mais...

Minha menina amava com tanta sabedoria que fazia-me parecer um garotinho, me sentia com quatorze e ela com quarenta e tantos, e assim até a senhora morte se fez acreditar, levando-a antes de me carregar em seus braços de fumaça.

Profundamente desolado, como faria agora? Não tinha mais meus sentimentos, nem meu alimento, nem nada. Virei um vazio em forma de bicho homem. Implorei com tanto ardor pra senhora fumacenta me levar que caiu a rir. "Patético" ela disse, "Não teria coragem de morrer". Como não? Se sentia-a me morto já naquele momento? "Por favor" implorei incansavelmente, então dançamos. Dançamos tanto e tão entretido fiquei que me sentia vivo novamente, quando cai nos braços magrelos de alguém. Era minha menina.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Oh, homens

Um dia eu estava andando, andando mesmo, com minhas pernas e pés e corpo inteiro. Do meu lado, um senhor, sorridente e despreocupado andava junto. Eu estava indo pra casa, e ele procurando a sua. Não trocamos olhares, nem compartilhamos partezinhas da alma, mas estava estampado em seu nariz o quão grande era a sua felicidade.

"Como seria sua casa?" me indaguei furiosamente minutos depois... Simples, claro! Pois era homem, e não precisava de algo grande, bonito ou... rico. Era homem, e homens são movidos à cobre, não ouro ou coisa mais sofisticada, mas pelo simples e abundante cobre. Não precisava de muito pra agradá-lo, mas quando agradado, ficava assim, pleno como numa casa invisível.

Homens, homens, claro que são bichinhos bem interessantes, um deles aliás, acabou de passar em frente à minha casa, com olhinhos de rato, curiosos e desconfiados. Outros que vejo na rua tem bigodes tão bonitos quanto eu poderia almejar, seria um absurdo desejar um bigode tão bem amado.

Outros eu vejo e penso "caramba, como eles conseguem se diferenciar?" deve ser uma dificuldade imensa! Assim como é dificílimo saber qual Slitheen é qual. 

E alguns, os que eu mais gosto, tão bonitinhos, com a alma enroladinha na dificuldade de enxergar o futuro. Não enxergam mesmo, aliás, não conseguem ver além de seu braço esticado. E são lindos, graciosos e perfeitos, de olhar e de tocar, de andar junto e ver as ruas envelhecerem, de acordar e perceber que não vão sair da cama até dormirem de novo, de chorar e saber que logo mais vão estar rindo, de amar e saber que não é perda de tempo.

Claro, tem muito mais coisa escondida nas barbas que roçam o tempo, e que assim como a simplicidade de tudo que os rodeia, vai chegar até nós como um sopro na orelha.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Elevador

Havia uma orquestra inteira dentro do meu coração. Dentro do meu corpo! Cheguei a achar que estava grávida de quadrigêmeos, mas eram apenas as dores que você sempre me fez sentir.
Ah, mas minha alma sentia-se tão serena e preguiçosa, assim como um amanhecer em Dubai. Vieram os tambores, as trombetas, o piano... Ah o piano, tão delicado, simples e grandioso. Toda minha ansiedade veio a tona.
A melodia não era triste, porém fazia todos chorarem, assim como quando assistimos um filme muito bonito. Ou quando nos sentimos satisfeitos por um trabalho árduo realizado.
Neste momento, no exato momento em que minha falta de visão fez minhas bochechas se sentirem molhadas, eu percebi o enorme tamanho da minha vida, e o quão valiosos são meus sentimentos. Meu sofrimento devia mesmo manter suas raízes em algo tão insignificante? No seu solo tão pobre...
Desisti! De tudo e de todos. Meu cérebro se desintegrou, só falo em espanhol, por favor me poupe de todo o seu falso amor.

Queimem o amor!

Fui falar com a senhora do amor e ela era uma bruxa.
Me mostrou coisas tão feias e tristes. Desisti de amar. Desisti de me aventurar.
Voltei pra casa e mergulhei numa banheira de arrependimento. Eram tristes e feios... Mas eu realmente queria vivenciar aquilo.
Fui falar com a bruxa do amor, bruxa das lágrimas, que seja, e ela estava lá me esperando! Sabia que eu iria voltar...
Vivenciei o amor... Que lindo! Que colorido, que perturbador, que melancólico, que prazeroso, que horrível, que triste!
Oh! Como eu saio disso? É tão grande o amor, tão complicado e cheio de armadilhas! Não, não quero sair, quero permanecer pra sempre aqui, porque eu estou amando! Amando amar o amor.

sábado, 15 de junho de 2013

Nuvem de borboletas

Coloque meu amor com seus whiskys e melancolias. Você sabe que eu sei muito bem o quanto é superficial e essencial meu amor para sua alma. Superficial por ser um sentimento não muito constante, mas necessário sempre que lhe aperta o coração.

Foi no dia em que as nuvens resolveram descer à cidade, estava tudo muito branco e agradavelmente frio. Seus olhos gentis apareceram na minha frente, olhos assim que esbanjam bondade e te olham como se soubessem sobre seus pensamentos e tivessem uma opinião formada sobre todos os seus sentimentos. Olhos prazerosos de se olhar.

Meu amor foi despertado, assim como a alegria, a nostalgia, o desespero, a ansiedade, entre outros que atiçam as borboletas no estômago. No meio daquela paisagem nebulosa, aconteceu nosso primeiro encontro. Dois desconhecidos capazes de se amar por vidas infinitas.

Estranho como a alegria e a tristeza se assemelham. Quando sinto alegria, minhas lágrimas vem a tona, meu estômago se agita e tenho vontade de chorar, como se o motivo de minha felicidade pudesse a qualquer hora desaparecer como uma poeira no meio do espaço. Quando estou triste tenho vontade de chorar, como se esta nunca mais fosse desaparecer. Ambos causam a mesma reação, e os mesmos sentimentos de alguma forma, e ambos são extremamente prazerosos.

Nosso amor é lindo, quente, alegre, triste, melancólico, insólito, vistoso e oque mais quisermos. Nosso amor é oque a gente quer, não na hora em que queremos, nem na ordem em que queremos, mas essa é a beleza dele.

Me olhe como você sempre faz e diga "eu te amo" mais uma vez com seus toques, mostre-me sua alma como nos nossos momentos mais profundos e nossas almas irão dançar mais uma vez embalados nas nuvens de um céu infernal.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Sobre circunstâncias

Estava frio, muito frio, e Alexandre não podia se sentir mais vivo.

Todas os dias eram os mesmo, seguiam-se café, aula, almoço, conversas, aula, janta e tristeza profunda.
A vida de Alexandre não era das mais exitantes, era na verdade uma das mais deprimentes que eu já ouvi falar.

Aos 7 anos, em plena curiosidade infantil, fora esfaqueado nas pernas por ser testemunha de um assalto no beco de sua cidade natal, não suficiente perdera os movimentos das mesmas.
28 anos depois, estava acostumado com a cadeira de rodas como se essa já fizesse parte de seu ser. E agradecia sempre por não ter se tornado um velho repugnante, daqueles que falam baixinho no ouvido de suas alunas mais promissoras "Ninguém precisa ficar sabendo"... Velhos grossos, pervertidos, e egocêntricos.

Lecionava inglês em uma escola não muito bem falada, suas alunas, jovens ninfetas esbanjavam vivacidade e frescor, e uma delas era minha irmã, 16 anos, linda como uma flor que acabara de desabrochar.

Tínhamos acabado de entrar no inverno, a estação mais esperada, mais amada e mais odiada por todos. Alexandre estava fazendo a chamada, e como sempre ao dizer o nome Luna, seu coração palpitou ferozmente e sua face enrubesceu. "Aqui" ouvido como uma melodia eletrizante, tal melodia saída de lábios rosados e umedecidos, num rosto angelical moldado por cabelos negros e lisos. 

"Oh Luna, tão provocante. Seus olhos impiedosos não me poupam por um segundo sequer, admito que por ti sinto enorme atração, e imagino que seja recíproco. Mas oh, criatura tão bela, tão feroz, de inteligência divina e persuasão inacreditável, cuidarás bem de meus sentimentos? Se entregá-los a ti, jura que não os fará seu inseparável brinquedo? Se bem que não me importaria se eu fosse sua diversão, só quero estar contigo e contigo permanecer."

Pobre Alexandre, Luna tinha mais parceiros do que ele tinha meias. Sinto-me culpada até hoje por ter roubado algumas folhas de sua agenda. Mas entendam, sem estas não estaria entretendo muitos de vocês neste exato momento, não me julguem.

Luna, Luna, achava-se tão esperta e altiva, porém não se lembrava que tinha um coração adolescente e que este um dia chegaria a bater como nunca antes por uma pessoa amada. Felizmente sim, esta pessoa era seu professor de inglês. Como o admirava, sua aparência frágil e inocente fazia-a imaginar cenas absurdas!

Voltemos ao dia em que começamos esta história. Não estava presente, meio óbvio, mas tenho provas escritas retiradas da agenda de um homem apaixonado.

"Estava tão frio, e todos sabem que detesto o frio, mas neste dia 13 de fevereiro de 1972, me senti o homem mais sortudo do mundo. Ela me esperava na biblioteca, sabia que eu ia lá toda sexta-feira. Quando a vi, uma surpresa tomou conta de todo meu ser, se minhas pernas pudessem tremer, tenho certeza de que cairia ali mesmo, como um tolo. Linda como sempre, seus cabelos terminavam onde começavam seus seios, seios não muito fartos, porém orgulhosos e vistosos. Suas pernas descobertas liberavam minha imaginação e seu olhar me matava lentamente. Vi sua imagem se aproximar provocativa, chegou perto de meu ouvido esquerdo e sussurrou "Gosta de correr?" Permaneci em silêncio, que resposta ela esperaria de uma pessoa em uma cadeira de rodas? Não incomodada pelo silêncio, pôs-se a empurrar minha cadeira normalmente até sairmos da escola, a partir da saída ouvi algo como "Preparado?" e uma respiração profunda. Nunca havia sentido o vento daquela maneira em meu rosto, Luna estava me empurrando em tamanha velocidade que me senti vivo, como em todos os anos da minha vida nunca me senti. Olhei para trás e sua face se enchia de felicidade, chorei como nunca, ri como nunca, amei como nunca. Corremos até minha casa, onde o frio fora substituído por um calor incessante. Nos amamos tão sinceramente. Nossas almas dançaram no ritmo das batidas de nossos corações. Lembro me nitidamente de cada parte de seu corpo desnudo, cada curva, cada textura, posso senti-las em meus dedos mesmo agora. Oh minha amada Luna, tão minha como sou dela."

Na semana seguinte, professor Alexandre não foi a escola, nem na outra, e nem nas que se sucederam. Não suportaria ver sua amada flertando com outros garotos de sua idade, não aguentaria. Mudou-se então para algum lugar, não sei onde, mas pelo que sei anda feliz.

Minha irmã nunca mais tocara no assunto, porém toda vez que suspirava em dias frios olhando pela janela, sabia que era nele em quem pensava e por quem chorava.
Mostrei a ela a ultima coisa escrita pelo seu amante.

"Nunca vou esquecê-la. Luna, dona dos meus sentimentos mais bonitos."

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Possessiva satisfação

Simplesmente odeio todos os seus filmes preferidos, suas músicas, seus jogos, desenhos, artistas, diretores e escritores. Detesto todos profundamente. 

Tenho o direito de permanecer calado, e gozei deste até não poder mais, pelo fato de amá-la tão profundamente e não querer ferir seus sentimentos com tal realidade incômoda.

Não me peça explicações de tamanho ódio. Os filmes de sua admirável preferência são realmente reconhecidos, e criticados beneficamente. Suas músicas são também as preferidas de muitas outras pessoas. Os jogos mais comentados são os que você fechou em poucas horas. Vejo referências em todas as redes sociais dos desenhos que você assiste. Os seus artistas aparecem sempre na TV. Como não reconhecer seu diretor favorito por sua tão comentada peculiaridade no modo de mostrar os mínimos detalhes que fazem toda importância nos filmes? E os escritores, romancistas homossexuais e blogueiros.

Conseguiria dizer o motivo pelo qual eu detesto tanto oque te faz feliz? Poderia ser um egocentrismo e uma carência possessiva da minha parte de fazê-la amar somente uma coisa por toda a sua existência? Seria, digamos assim, porque eu quero que me ame, e somente a minha pessoa e mais nada nem ninguém, músicas não poderão mais ser admiradas, filmes não poderão mais comovê-la e livros não ganharão mais sua fixação.

Só quero que seja minha, porque a amo, e sei que isso será o melhor para você. Querida, estamos passando por tempos difíceis aqui, o senhor presidente não te avisou? Querem explodir o mundo! Irão usar palavras para isso, palavras e sorrisos, músicas e filmes, desenhos e pessoas bonitas, nós. Não quero te perder como uma bomba relógio.

Faça como eu e ame. Me ame. Tudo oque precisamos, é o nosso amor.

Vamos bombardear o mundo com estrelas. Vamos criar uma guerra em seus corações. Vamos derramar sangue em suas bocas. Mas não vamos fazer nada.

Porque eu te amo, e sei que é por esse amor que eu sempre vou lutar.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Até que a realidade apareça

Você já chegou naquela fase da vida em que se pergunta "Mas que porra eu estou fazendo?"

Um dia eu acordei, a sala estava absurdamente clara. Havia adormecido enquanto assistia tv, assim como uma velha, ao meu lado estavam pilhas de papéis a serem lidos, re-lidos, interpretados, e passados à outros papéis, no espelho vi meus olhos contornados por um grande borrão de maquiagem, e eram apenas duas horas da tarde... Numa quarta-feira.

Mas que porra eu estou fazendo da minha vida?

Estava estudando, claro, mas caia entre nós, me tornar uma advogada e mudar o mundo estava longe da minha realidade. Fazia isso apenas para ter um diploma a que me gabar, mas nem um diploma conseguiria ter... Minhas notas estavam péssimas! Provavelmente desistiria da faculdade e iria trabalhar numa lanchonete. Mas como observadora da minha vida atual, posso dizer que não o fiz.

OK, continuaria a faculdade, na melhor das hipóteses me tornaria uma advogada famosa, seria venerada pelo mundo inteiro, fariam seriados sobre minha vida e muitas pessoas chorariam no meu velório. Velório!
Qual a maior certeza da humanidade se não a morte? Nascemos, logo morremos. 

Eu sei, estou sendo muito negativa e pessimista. Mas entendam por favor, quando tinha 5 anos, queria me tornar uma detetive super legal e peculiar como o... Monk. Hoje, meu objetivo é não me tornar uma mendiga. Ta, sem exageros agora, não me tornaria uma, mas ver minhas perspectivas de vida diminuindo tanto assim, me fazem perder a vontade de continuar.

Precisava de uma moral para esse texto, mas qual, se não a que vocês mesmos chegarão, se é que chegarão.

Bom, é normal acho, esse tipo de coisa acontecer. Isso porque crescemos, e percebemos o mundo como ele realmente é, feio, decepcionante e perturbador. E acabamos fazendo parte disso, empurrando a engrenagem para que nos decepcionemos mais e mais.

Não é uma questão de fechar os olhos e ignorar a realidade, mas sim, de não trair a si mesmo, para seguir as normas sociais. Afinal, o que poderíamos ser se não sinceros com nós mesmos? A sinceridade, é a forma mais eficaz, de não decepcionarmos a criança que um dia enxergou um futuro bonito, assim como ele realmente deveria ser.


domingo, 12 de maio de 2013

OK, o frio não é tão ruim assim

Mais uma noite, encantadora diga-se de passagem, e fria. Algumas pessoas adoram o frio e vivem por sua chegada, eu particularmente não dou a mínima, e estou agora deixando de lado meus afazeres para entregar minha alma por completo ao prazer de escrever algumas baboseiras.

Todos achavam estranho a quantidade de gelo que Ben usava em sua casa, para onde ia tudo aquilo afinal? Alguns boatos como "Tenho certeza que ele tem uma fábrica de sorvete no subsolo de sua casa" se espalhavam como poeira ao vento, incomodando alguns olhos que passavam por ali. A verdade era que Ben, Ben Noble cultivava algo de grande importância, algo que não dispensaria todo aquele gelo, e era isto o corpo de sua amada, a qual escolheu passar por esse procedimento por descobrir uma profunda melancolia em sua visão da vida.

Seu nome era Rita, não tinha boa aparência, mas seus cabelos negros ondulados faziam com que os olhos alheios não reparassem em sua face rígida e seus olhos impiedosos, tão grandes e bonitos eram.
Nunca se sentiu satisfeita com a vida, e foi assim insatisfeita de país a país, na falsa esperança de encontrar a felicidade, e encontrou. Foi na Inglaterra em 2010, quando avistou Ben conversando com uma mulher loira, alta, linda e magra, daquela que vimos nas revistas e comerciais. "Ele é tão baixinho e magrelo, não pode ter algum relacionamento com esta mulher" pensou ela, quando na verdade eram irmãos, não de sangue, mas mesmo assim irmãos. Não sabendo disso, Rita achou a situação cômica, tamanho era o contraste entre estas duas pessoas, foi então que lembrou que possuía lábios não só para beijar estrangeiros desconhecidos, mas também para formar uma linda -na verdade bizarra- curva em seu rosto. Sorrindo passou várias semanas até sua grande descoberta. 

Como muitas outras pessoas, ela adorava o frio, como quem adora comer maçã antes de ir ao dentista, e foi num dia exatamente como de seu agrado, que veio-lhe a mente que comprar um apartamento com vista direta à casa de Ben não faria sua felicidade durar tanto tempo, afinal, ele nem sabia de sua existência. Estufou seu peito com o ar cinza da cidade, e foi a andar em direção ao motivo de seus sorrisos. Explicou que não conseguiria ser feliz em suas atuais condições, e pediu para que Ben a mantivesse em seu estado mais prazeroso, fria e feliz. O homem por sua vez ficou encantado com a peculiaridade daquela mulher desconhecida, e aceitou realizar seu desejo, com a condição de que fosse em sua casa, e que deixasse seus lábios descongelados, para que pudesse beijá-los sempre que lhe desse vontade. Entrado num acordo, gastaram-se toneladas de gelo por anos e um freezer vertical com porta de vidro, tão lindo quanto as demais decorações da casa.

Apenas os lábios eram deixados para fora do gelo, estavam roxos e duros, mas eram símbolo do grande amor de Ben, e foram preservados em um sorriso, estranho, mas sincero de Rita.

Comentários continuaram indo e vindo, mas a verdade por trás deste fato é tão singular e especial, que passaria facilmente por mais um boato, mesmo se contada seriamente.

sábado, 6 de abril de 2013

Quites

Nenhuma ousadia era tão embaraçante quanto o amor reprimido. Estávamos tão embriagados um do outro, que reprimir oque sentíamos era deveras vergonhoso.

Foram dias turbulentos, mas maravilhosos. Você como sempre conseguia transformar tudo na mais divina lembrança, e na mais torturante também. Aconteceu aos poucos, meu coração foi rachando, risco por risco... Até dar lugar ao que tenho agora, um defeituoso e provisório, pulsando na espera de que meus sentimentos se tornem de novo meus, e não inteiramente seus como por tanto tempo permaneceu. Sofrido e sujo, tal como tudo oque suas mãos tocam.

Te disse uma vez, que achava estar grávida, e realmente pensei, até ver parte que podia ser sua sendo expulsa junto ao endométrio. Como sempre foi maravilhoso e triste, nossos filhos seriam lindos, mas não teriam amor, largaríamos eles em alguma porta ou venderíamos para o tráfico de bebês. Sim, faríamos exatamente isso.

Nossa relação era um lixo, mas não era nisso que eu queria acreditar, não era nisso que eu acreditei por vários anos. Continuei me enganando, até que aromas, visões e peculiaridades não escondiam mais tamanha podridão do meu coração.

Talvez por já me sentir tão confortável naquela situação, deixei-a permanecer assim. E me acostumei a sofrer ao seu lado, mas não com você. As vezes discreta, as vezes tão alto que todos percebiam, até os que nos achavam perfeitos um para o outro, oque de fato éramos, mas de um jeito particular, e só nosso, sofríamos e nos amávamos como ninguém nunca fez.

Me desculpe, era minha intenção, e saiu tudo na mais perfeita ordem, mas agora sinto sua falta... Não devia tê-lo esfaqueado... Fui levada tanto pelo momento, que os cortes simplesmente surgiam na minha frente sem que pudesse pará-los. Me desculpe.

As pessoas me tratam feito louca aqui, mas impossível enlouquecer mais do que o fiz com você, veja bem, sua morte foi totalmente planejada por si próprio. Enlouquecia-me e apodrecia-me sem ressentimento, pois sabia que o amava mais que tudo, e podia odiá-lo mais que tudo também, sabia que um dia, chegaria a te matar, e era exatamente isso que queria, afinal, nem você conseguia se aguentar...

Me desculpe, e não, não precisa agradecer.

quinta-feira, 28 de março de 2013

O cura almas


Ela o viu poucas vezes apenas, mas o "homem do sorriso bonito" como o denominara, ganhou um lugarzinho em seu coração.

O mundo todo estava errado, e encontrava sua verdade na realidade daqueles lábios curvados que combinavam perfeitamente com seus olhos gentis. Viu-o pela primeira vez no fatídico dia absurdamente claro, em que sua cabeça latejava e seu rosto aparentava ter sido várias vezes amassado como uma folha de papel. Trajava roupas velhas, porém novas, uma camiseta que ganhara em seu aniversário há um ano e uma calça que comprara há dois, as últimas peças novas que lembrava possuir. Com tal vestimenta e os olhos semicerrados devido a demasiada claridade, encaminhou-se a farmácia próxima ao seu trabalho e pegou três cartelas de comprimidos para dor de cabeça, ao fazê-lo avistou no penúltimo caixa oque estava predestinado a seus olhos naquele dia, um homem alto, de cabelos pretos bem cortados, olhos gentis e um sorriso lindo, destoava de todas aquelas pessoas rastejantes ao seu redor, inclusive ela.

Como todas as outras pessoas talvez, se sentia inferior, porém dona de todas as verdades do mundo, mas apesar de toda essa negatividade e crise existencial que a tomava por completo, sentia-se especial e privilegiada por cruzar o caminho com uma pessoa como aquela no caixa de uma farmácia, onde além de encontrar conforto à sua dor física, achou também para sua alma descolorida.

"Boa noite" e "Obrigada" foram as palavras ditas pelo homem do sorriso bonito, palavras que ela guardou com grande ternura. Palavras que a consolavam em dias de melancolia, dias em que voltava para casa e chorava baixinho debaixo das cobertas.

Passava de vez em quando perto da farmácia quando ia ao trabalho, e procurava ele com um breve olhar, sem parar de andar. 

Nunca mais se falaram, mas seu romance, que durou uns poucos minutos, ficou gravado no tempo por toda a eternidade.

terça-feira, 5 de março de 2013

Setsuko

Completavam-se vários dias em que se sentia plena, plena por si mesma, como se seus mamilos peculiarmente bonitos fossem o centro de todo o universo.

Em um dia fatídico, mais precisamente numa quarta feira alaranjada e pesada, passou a noite em sua casa bebendo whisky com gelo e lágrimas. E assim sucederam-se vários e vários dias da mesma forma. Bebeu whisky pois fora pega de surpresa pela tristeza, sendo esta a única bebida alcoólica que residia em sua casa, que particularmente detestava o gosto. A cada gole, ia garganta abaixo seu choro orgulhosamente reprimido. 

Seu mundo desabara, seu mundo que era totalmente de outra pessoa, simplesmente desabara como se cai um castelo de cartas com apenas um sopro. Sentia como se seu coração fosse embalado a vácuo, sufocado, apertado, tão apertado que fazia transbordar suas lágrimas sem que o maior esforço possível para reprimi-las surtisse algum efeito.

A possibilidade de suicídio porém nem passara em pensamento. Vivia cada dia normalmente reprimindo o furacão dentro de si, e de noite, engolia a si mesma com vinhos e melancolia. E se sentia bem. Como se o padrão melancólico da sociedade a fizesse extremamente feliz. 

Vivia feliz, sentia-se completa em sua tristeza, como se esta preenchesse o vazio de sua impossibilidade de sentir.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Vertigem

"Eu estou bem" Continuava a repetir sem perceber que as lágrimas já escorriam por seu rosto.

Seu amado agora só sobrevivia no perfume que deixara em seu travesseiro noite passada, onde envolvendo-a tão calorosamente entre os braços fez afirmações injustas e absurdas sobre a relação de ambos, sete meses foram então jogados no chão, encharcados por intermináveis lágrimas e atingidos furiosamente por gritos indignados.

O quão errantes são os olhos apaixonados.

Estava ela agora, com mais reclamações do que uma vida poderia oferecer. Pobre garota. Disseram-lhe que a juventude era bela, mas quantas foram as vezes que tentara se suicidar no banheiro de casa, ou no canto de seu quarto? 17 anos não foram o suficiente para que sua juventude viesse a florescer, ou a pessoa que lhe disse aquilo era realmente problemática e gostava de sofrer.

A realidade era tão mais feia quanto podia imaginar, e seu mundo se tornara tão mais sombrio que lhe saia do controle. Onde mais se refugiaria a cada aperto de coração?

Passou-se um ano sem que as coisas sequer começassem a caminhar por outro rumo. Não aguentaria, não queria mais pagar para ver. 

No auge de sua angústia, com o peito queimando em lágrimas e a cabeça vertiginosa, realizou o ato final, tão discreto e refinado, nada parecido com os ensaios, oque o fez mágico. 

Da sala de estar podíamos ver, deitada logo na entrada do banheiro com uma arma na mão, e a cabeça em um travesseiro vermelho e ainda quente.

Foi corajosa. Ao contrário do que muitos pensam, é preciso muita coragem para se matar. Acabara com todos os anos que ainda estavam por vir, do mesmo jeito que a vida acabou com a alma daquela menina de 18 anos.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Cegueira

Não estaria sendo presunçoso ao dizer que também era alvo do amor daquela bela mulher. Era evidente que compartilhávamos do mesmo sentimento. Matar seu marido foi mesmo a melhor coisa que fiz em minha vida.

Qual o número exato de pessoas que passam por meu consultório todos os dias? Dez? Doze? Na verdade isso não importa. São todos doentes e patéticos, suas presenças não fazem diferença alguma na minha vida, a não ser pelo dinheiro que eles tem a oferecer. Houve no entanto um paciente em particular que não pude deixar de dar atenção, um velho com problemas nos rins, tão acabado como um pano de chão, devia estar por volta de seus sessenta e poucos anos, aparentando cento e poucos. Mas não é ele o foco principal deste texto, em partes. Sua esposa, quarenta e sete anos, formosa, firme, madura como em sua idade havia de ser, tinha olhos tão mais velhos que o resto de seu corpo... E que corpo, tão mais jovem do que sua idade poderia oferecer.

Voltemos pro velho, que trouxe-me um potinho com urina avermelhada. E que importância e atenção podia dar-lhe eu com sua esposa ao lado? Urina avermelhada, aparência péssima, andar curvado, disse-o então que se tratava de um câncer no rim já muito evoluído, e que uma cirurgia nesse caso não iria adiantar-lhe em nada. Todos deveriam ver o rosto daquele homem, tão apavorado perguntando-me se iria morrer, se não havia algum jeito de retardar esta doença, um rosto tão amedrontado que chegava a dar pena, tanta pena que não podia ser ofuscada pela beleza da mulher ao lado. Pedi-lhe então para fazer alguns exames, que com certeza ele não entenderia os resultados, enquanto dava a mim mesmo tempo para pensar.

Passei o resto do dia e a noite em claro, pensando nos lábios escarlate daquela senhora, senhora...  Senhora sem nome, ora fiquei tão admirado com sua aparência que me passou despercebido o fato de eu não saber seu nome e de não ter proferido nenhuma palavra. Pedi-lhe exames, que ficariam prontos em até uma semana, o que farei? Desejava tão intensamente esta mulher que me fugia o conhecimento do certo e do errado. 

Passando pela porta do meu consultório estava o Sr. Wiggle acompanhado pela Sra. Wiggle. Tamanha era minha vontade de transformá-la na Sra. Churchill que a loucura me veio a mente. Receitei a ele "remédios" caseiros, o qual retardaria o dia de sua morte pelo câncer. E foi nisso que Harold Wiggle acreditou até o dia em que morreu espumando pela boca.

Fui ao enterro, mas só para trazer à minha casa, Lydia, Lydia Churchill que sofria calada os maus tratos do velho carrasco, morto por envenenamento pelo médico cego de amor.


sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Atrasos

Olhos tão pequenos e brilhantes que à primeira vista, chamaram minha atenção. Eram azuis, amarelos, verdes, eram de cor indistinguível, místicos, profundos, tão velhos e astutos. Tão encantadores eram, que não poderia imaginar nunca -nem suportaria fazê-lo- que um dia se fechariam para sempre.

Eis a carta que me deixou:

"Meu amado, peço de antemão desculpas pelos erros ortográficos aqui cometidos, entenda por favor, que minha situação não é das mais favoráveis.

Ao ver-te fixados em meus olhos naquele dia ensolarado de inverno, pus-me a esquecer os pesares de minha vida, e me entregar ao prazer de uma nova paixão. Ocultei-lhe minha doença, e assim juntos, tivemos dias maravilhosos.

Amou-me enquanto eu era bela, e ainda podia andar, falar, escrever... E continuaria a fazê-lo não fosse minha vaidade tamanha que só vinha a aumentar ainda mais minha insegurança perante aos seus sentimentos, e por isso, pedi para que se distanciasse, e inventei que não gostava mais de ti, que meus sentimentos haviam se esgotado, e que estava já a muito cansada, apenas suportando sua presença ao meu lado, quando na verdade, dentro de meu coração, sentia o contrário, totalmente o contrário, a cada dia que se passava, mais forte era meu sentimento por você, e a felicidade que sentia ao te ter ao meu lado era tamanha, que não cabiam em palavras. Oh meu amor, que tola fui. Todo esse tempo distante da paixão de minha vida.

A doença fez cair meus cabelos, minha pele ressecar, meus movimentos ficarem lentos, e minha coordenação piorar. Quem gostaria afinal de ficar com uma pessoa de aparência abatida, que mal consegue andar decentemente sem atrair olhares desgostosos e falar sem dar pausas enormes entre cada palavra? Quem sem nem mesmo ter laços sanguíneos gostaria de ficar com uma pessoa assim? Oh, Tu farias isso por mim? 

Se estiver lendo esta carta, é certo que já estarei morta. Mas meu bem, não se desespere por favor, de nada vai aliviar o aperto em seu coração. Creio que tenha passado um ano desde que nos vimos pela última vez, tempo suficiente para que a enfermidade tomasse conta de mim, e me levasse a óbito.

Escrevo-te para esclarecer tudo oque ocultei tolamente, achando que seria o melhor para nós. E te dizer uma ultima vez que te amo, e esse amor, eu levo comigo durante toda a minha eternidade."

Não podia por em palavras a descrição de tal desespero que senti, mesmo sendo pedido para que não o fizesse, não pude evitar. Minha amada, morta? Quão insuportável isso me soava. Tanto tempo separados, por uma simples vaidade...  Seríamos tão mais felizes se não o tivesse feito, se soubesse que a amaria de qualquer jeito por todos os dias de minha vida, e até após a minha morte. Que tolo fui por não ter lhe dito isso antes, por ter aceitado que não nos víssemos mais...

Fui ao seu túmulo, não querendo acreditar no que via, seu nome no mármore gravado, em baixo, a data de seu nascimento, e de sua morte. Não consigo dizer quantas lágrimas por ti derramei. Digo apenas, que foi, e sempre será o maior amor de minha vida, que me fez ver o mundo com novos olhos, e que agradeço-lhe eternamente por ter compartilhado aquele olhar comigo no memorável dia de inverno, quando o frio tomava conta de meu corpo, quando a esperança e a felicidade de viver já tinham desaparecido de minha alma. Posso confirmar que você fez a minha vida valer a pena.

Te amo, e levarei esse sentimento para sempre em meu coração.