sexta-feira, 7 de março de 2014

Vida

Qual o maior prazer da vida de um ser humano se não reclamar da mesma?

Há tempos senti uma melancolia incrivelmente forte. Começara em minhas pernas fracas e cansadas, e passou logo para os pulmões. Acabei por esquecer como antes nem os percebia ali. Trabalhavam tão bem! Agora, como se invejassem as estruturas que me mantinham em pé, trabalhavam devagar e preguiçosos.

Acontece que era muito amada, e quando digo muito, quero dizer em demasia, amor que transbordava os limites do bom senso. Era mesmo como uma típica garotinha mimada e temperamental. Mas fazer oque? Fazia assim, e assim tinha que aceitar, me amava! Tão amada fui, que tal sentimento me trouxe ao que sou hoje, melancólica até os cabelos.

Não mentirei, tirava sim proveito de toda atenção. Que mal tinha? Me adorava! Mas tanto amor, tanta atenção, tanto cuidado, tanta preocupação, tanto tudo me irritavam. Comecei a trata-la mal, afinal, se fosse do meu jeito, importaria? Eu era amada!

Quanta melancolia... "Que pessoa em tal condição reclamaria da vida?" você perguntaria. A eterna busca humana não é mesmo o amor? E nem eu poderia dizer que tal exagero me trouxe ao que sou hoje...

Mas se não a tivesse, não reclamaria. A beleza da vida é mesmo esta, reclamar da dona, questiona-la, sobreviver com seu fardo e ama-la. Amar até não restar mais amor por nenhuma parte. Quando a melancolia e o ócio tomarem a alma e os cabelos, quando os pulmões pesarem, quando os olhos secarem e quando o coração se desabilitasse.

Tanta abundancia de um sentimento apenas me pesou tanto, que desisti de carregar tal fardo. Ela tão irritada e desapontada, mais triste que eu, disse que desistiria também. Mas como previsto, o apreço era tanto que não conseguira. Continuou amando, continuei me esquivando e me escondendo na melancolia.

Confesso que a amava também, tanto que quando resolveu partir, tomei de bom grado sua decisão, seria ela enfim livre para o amor próprio. E eu, sem mais do que reclamar, comecei a escrever.

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